Colunista
Dante Mendonça

13.11.12
A história terceirizada

Dizem que a terceirização originou-se nos Estados Unidos, com a II Guerra, quando a sobrecarregada indústria bélica tinha que se concentrar no desenvolvimento da produção de armamentos e passou a delegar algumas atividades para parceiros.

Os americanos estavam muito atrasados. No Brasil, a terceirização teve origem em 7 de setembro de 1822, quando o Reino de Portugal terceirizou o Brasil a Dom Pedro I. De lá para cá, temos muito a ensinar aos americanos, especialmente na administração pública, federal, estadual e municipal, quando nossos prefeitos delegaram a responsabilidade de construção e conservação de calçadas aos proprietários de imóveis urbanos. Nos Estados Unidos, a terceirização deu excepcionais resultados. Para os brasileiros, o resultado está nas calçadas de Curitiba, por exemplo, calvário dos pedestres.

A terceirização na história do Brasil tem sido motivo de muita polêmica por parte dos cientistas políticos, especialmente no período republicano: no Estado Novo, o ditador Getúlio Vargas terceirizou a polícia política para o fascista Filinto Müller. Em seguida, o caudilho deu um tiro no peito e terceirizou a vida à história. Jânio Quadros renunciou e terceirizou seus milhões de votos ao vice Jango Goulart. Na ditadura militar, os generais terceirizaram a economia para o ministro Delfim Netto e disso resultou o milagre brasileiro.

No Brasil moderno, a terceirização saiu do campo político, técnico e administrativo e chegou à cultura nacional. Em certa época, inclusive a culinária obedeceu a esse processo de gestão, quando terceirizou o “picadinho” para o “estrogonofe”. O mesmo aconteceu na música, quando nos terceirizaram para os quatro garotos cabeludos de Liverpool e um topetudo de Memphis. Na literatura, por muito tempo fomos terceirizados aos franceses e, até hoje, são raros os nossos intelectuais que não terceirizam seus próprios pensamentos.

A terceirização se estendeu também aos hábitos e costumes da classe média. Aconselhados a fazer exercícios físicos, podemos terceirizar longas caminhadas matinais a um “personal training”, enquanto assistimos o profissional suar em bicas. No campo espiritual, o devasso doa polpudas esmolas na esperança de terceirizar a salvação da alma.

Este mecanismo de gestão, no entanto, tem critérios de aplicação para alcançar resultados e, em muitos casos, o barato sai caro. Muito caro. Com a redemocratização, as mudanças apontavam para novas gestões, quando o desalento tomou conta da nação. Tancredo Neves terceirizou a faixa presidencial para José Sarney e isso nos custou caro, a hiperinflação. Fernando Collor terceirizou as sobras de campanha para PC Farias e o tucano Fernando Henrique, ungido para retomar novas práticas administrativas, só não terceirizou os próprios livros, mas pediu para esquecer o escrito. Não deu para esquecer.

Luiz Inácio da Silva, sobretudo, não esqueceu a escrita de FHC e fez escola no quesito. Primeiro terceirizou a campanha eleitoral para o mago Duda Mendonça. Eleito, terceirizou o poder para o comissário Zé Dirceu, que terceirizou o PT para Delúbio Soares, que terceirizou o partido para Marcos Valério, que terceirizou outros partidos para a base do governo. Essa terceirização nos custou caro, muito caro, não sobrou pedra sobre pedra. Não fosse o Supremo Tribunal Federal e a persistência do ministro Joaquim Barbosa, todas as culpas também seriam terceirizadas.










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