Colunista
Luiz Geraldo Mazza

06.12.13
Uma cisão inaceitável

Numa certa semana o então governador Jaime Lerner se viu às voltas com uma onda intolerável de violência e criminalidade. Concebeu um contato com a mídia para ver qual a interpretação dominante e que estratégia deveria ser seguida. O chefe da Casa Civil, Cândido Martins de Oliveira, me mandou um convite especial e lá compareci. Durante uma hora desfilaram impressões de radialistas e repórteres da área: queriam revitalizar os módulos policiais que achavam mal substituídos pelo totem que disso tinha o significado sociológico do símbolo clânico da tribo. Aí o Candinho foi à tribuna e pediu licença a Lerner para que eu fizesse, como todos os dias pela rádio, uma exegese da matéria. E fui lá, convidado, alertando o governador que ele jamais resolveria os problemas de segurança se não recuperasse as prerrogativas que de forma indevida delegou ao deputado Aníbal Curi. Ouvir esse tipo de verdade é o inesperado, o insólito, um choque, já que lá estavam as cúpulas da civil e militar, que ficaram perplexas com o óbvio que sabiam e fingiam ignorar.

A polícia raramente é fator de prestígio de um governante pelo descompasso entre suas condições operacionais e as dimensões do problema social a enfrentar. Tivemos alguns políticos que passaram como atores da polícia como Alfredo Pinheiro Júnior, deputado estadual, chefe de Polícia, ou Peregrino Dias da Rosa Filho, Agostinho Rodrigues e Ítalo Conti, ambos milicos, deputados federais, que passaram pela área. O mais bem-sucedido de todos foi Ney Braga, que nomeado chefe de Polícia pelo ex-cunhado Bento Munhoz da Rocha deflagrou ali a sua carreira que já em 1954 o elegeria o primeiro prefeito de Curitiba. Ney conhecia não apenas todos os servidores da polícia como também todos os taxistas da capital, tal como se convive com a hierarquia e a soldadesca no Exército. E foi em favor de taxistas que enfrentou o primeiro sequestro de um profissional cujo corpo foi lançado na represa do Vossoroca, estrada de Joinville. Preso o assassino havia a preocupação em mantê-lo vivo a despeito da intenção de linchá-lo que tomava conta da classe e Ney se tornou um líder de taxistas e também dos estudantes, embora a disposição normal da Une e da Upe em fazerem o papel de rebelados como sempre, hoje nem tanto, mais para chapa branca.

O uivo do campo

Nesse período tivemos a mais forte das rebeliões, a de Porecatu, quando houve o maior número de organizações campesinas da história brasileira e se achava em andamento a do Oeste-Sudoeste na qual Ney, já governador, apareceria em aliança com o governo de João Goulart e junto com o Grupo Executivo de Terras para o Sudoeste na maior distribuição de títulos a mais de 50 mil lavradores.

É a polícia uma escala na carreira política? Nem sempre, já que o posto gera mais ônus do que bônus, ainda mais agora com a articulação do crime organizado. Um bom policial, como era o caso de Rubens Tanure, da Federal, e que ocupava o cargo na gestão referida de Lerner, ou um dos homens de ouro da PF, como Moacir Favetti, que a assumiu sob Requião, jogou pesado na questão das bruxas de Guaratuba ao ponto de afirmar publicamente que se qualquer dos indiciados recebesse habeas corpus da Justiça os entregaria à multidão. Visível no caso o envolvimento emocional pela repercussão do evento e o fato de a polícia agir dividida já que um setor fiel ao deputado Aníbal Curi defendia a inocência das denunciadas, a esposa e a filha do prefeito Abagge da cidade balneário.

Segurança é uma obrigação imperiosa de Estado, ao lado da educação e saúde, às vezes impondo, como nos casos de Rio e São Paulo, a montagem de sistemas e ações que substituam a ausência de governo em assentamentos como as favelas e núcleos marginais. No Paraná vivemos uma situação singular: o secretário, Cid Vasques, figura de destaque do Ministério Público, é questionado por sua corporação em função de haver estabelecido um sistema de rodízio de policiais civis e militares no corpo do Gaeco, Grupo de Ação Especial contra o Crime Organizado, o que gera um ponto de tensão, em que pese a solidariedade do governador e dos quadros das polícias civil e militar e que tramita no Poder Judiciário. Não foram poucos os membros do MP que ocuparam funções na Segurança e na Justiça como agora com os desembargadores Lopes de Noronha, Jesus Sarrão, Chemin Guimarães e mais recentemente Luis Fernando Delazari, esse inclusive botando em risco a sua carreira por haver optado a servir o governo Requião.

É um choque de autonomias (o MP a conquistou na Constituição de 1988) até aqui mal administrado pela autoridade maior, o governador, que deveria empregar a força do seu talento de persuasão em favor do seu ponto de vista na sustentação da unidade de governo, já desafiada no início da gestão quando um grupo de policiais encapuzados, num ato de amotinamento, invadiu a mansão de suposto protegido em que se praticava lenocínio e jogos. Essa luta, a da segurança, não admite divisões do gênero, ousadas como aquela ou de leniência burocrático-administrativa intrapoderes como a do presente momento.

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