Colunista
Luiz Geraldo Mazza

26.06.12
O olho do Foggiato

Do período clássico do nosso jornalismo, de sua fase mais romântica dos anos 40 aos 60 do século passado, poucas duplas chamavam tanto a atenção como a dos repórteres fotográficos, pai e filho, os Foggiato: o velho Sperandio e o mais jovem Miló. O velho‚ autor de cenas inesquecíveis como a de um gol que o Coxa fez no Ferroviário não captado pelo juiz Manoel Alencar Guimarães e quem mexeu artisticamente na  área do crime, o goleiro Pianowski, que com os pés removeu as redes para dar a ideia de que a bola entrara por fora. Foi lá  no Durival de Brito e Silva e o gol do Renatinho, um dos melhores pontas da época.

O Foggiato mais velho, como o filho, era servidor público e trabalhava na área de comunicação oficial desde os tempos da ditadura Vargas aqui representada pelo Maneco Facão e pelo Departamento Estadual de Imprensa e Propaganda, decalque inferior hierárquico do nacional, o atemorizador DIP. Já  depois do Estado Novo operava em seu lugar a Câmara de Expansão Econômica do Estado num prédio em que hoje funciona, na Saldanha Marinho, um motel chamado Don Juan. Nesse local, como funcionário do governo Munhoz da Rocha, vi coisas incríveis como a revelação de fotos de manifestação em que eu e o Newton Stadler de Souza, servidores da casa, aparecíamos diante do Palácio São Francisco numa passeata contra o aumento da carne, fortemente reprimida. O policial Ascânio Abreu viu as revelações e avisou-nos, tirando sarro, mas falando sério, que seríamos certamente fichados nos registros de segurança federal. E fomos ali e na sequência.

Essa foi desagradável, mas outra compensadora: fiquei ao lado do padre Lebret, dominicano, líder mundial do “solidarismocristão’’, movimento que abriu caminho a outros de esquerda no catolicismo e de grande influência nos sistemas de planejamento, como doutrina, no Paraná  e no Brasil.

A queda e a maçã

O Foggiato pai vai com uma comitiva do governo para documentar áreas do xisto pirobetuminoso em São Mateus do Sul, deflagração da campanha para que ali se instalasse a usina piloto, o que se daria muitos anos depois. Antes houvera algo espetacular: na crise dos combustíveis em meio à guerra: um “alemão’’ de São Mateus refinou o xisto e o transformou em gasolina para abastecer seu carro e mostrar o feito na Capital a Manoel Ribas num tempo em que os carros andavam a gasogânio e o Brasil já  fizera experiências com o álcool nos anos vinte.

Diante das formações do folhelho, o Foggiato teve que se afastar para captar uma panorâmica e, como se fosse uma mistura de Cantinflas com Carlitos, caiu numa depressão, assustando todos, mas com lesões sem gravidade. Anos depois a Petrobras, erigiria, erradamente sob o ponto de vista técnico, Tremembé, uma cidade paulista, para a usina experimental, o que seria corrigido, muitos anos depois, pela pressão dos homens de ciência do Paraná, área hoje não tão densa como na época do Instituto de Biologia e Pesquisas Tecnológicas, herança de Reinhard Maack, Metry Bacila e tantos outros como seu líder Marcos Augusto Enrietti.

Em 1953, centenário, dez congressos por dia, somos escalados eu e o Miló para cobrir o lado social de um encontro mundial de cardiologistas no Graciosa Country Club. Dona Flora, esposa do governador, reúne mulheres congressistas e esposas de participantes numa sala para um jantar. O Miló tinha o hábito de pegar frutas importadas (aqueles tempos não as tínhamos) como maçãs e peras das mesas e colocava-as no bolso e as misturava com as lâmpadas do flash. Chamado para documentar a cena, mete a mão no bolso e retira de lá a maçã que não se ajustava ao flash. Foi uma cena rápida, de alguns segundos, para mim uma eternidade, lembrei até da musa literária‚ de “Maçã no Escuro’’, rezando para que se fizesse a luz, mas com movimentos rápidos de um prestidigitador ele acertou o flash e documentou a cena. Amém. Porque o Miló era uma alma bem mais doce do que aquelas iguarias e não merecia por suas artes qualquer constrangimento.

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