Colunista
Luiz Geraldo Mazza

08.07.12
Flashes constrangedores

Estou no campo do Juventus, Estádio Franklin Delano Roossevelt, no Batel, num jogo do Coritiba. Atrás do gol, não me conformo com um impedimento marcado pelo Ataíde Santos, o árbitro e o chamo de ladrão. Ataíde, com a classe de um Cesar ao ser apunhalado por Brutus, não usa o latim “tu coque, Bruti, fili mi” (até tu, Brutus, a quem considerava meu filho!), mas me pune secamente “até você, Mazza?”, pondo em relevo a minha grosseira incivilidade.

Convenci-me também nesse caso que Curitiba é um ovo, no meio da suposta massa o homem me descobre e pune pedagogicamente com a identificação. E depois ainda uns delirantes imaginam estádios de 100 mil torcedores. Pra magoar alguém um curitibano transformaria a pessoa visada num albino no Maracanã.

A companheira Estou no “puleiro”, a barra pesada do cine Santa Helena em Paranaguá de olho no filme “A companheira de Tarzan”. Se Adão, de cara, encontrou Eva, o rei das selvas demorou um pouco mais. Daí a ansiedade com que fomos ver a bela Jane, Maureen Sulivan, mãe da Mia Farrow, pela vez primeira. Logo numa tomada daquele lar rústico em cima das árvores, Jane prepara o café da manhã para o homem macaco e leva um ovo gigantesco de avestruz. Nessa hora, um parnanguara não se aguenta e grita “É o ovo de Fonc”. Foi o suficiente para quebrar o pau no cinema. As luzes foram acesas e a vigilância redobrada para evitar a baderna. Maldade e morbidez no saque: o cidadão referido era funcionário da Força e Luz e sofria de orquite que agigantava a bolsa escrotal.

Mais crueldade Uma das famas, hoje amainada em Paranaguá, aliás comum nas cidades litorâneas como Itajaí, São Francisco, Antonina, Floripa, era a de dar apelidos, alguns talentosos como o feito em cima do escritor Wilson Galvão do Rio Apa. Ele e a mulher, Esther, e os filhos Kim e Thor, estão na estação ferroviária. Rio Apa com a sua barba nazarena, o cabelo comprido e o “jean sablon”, uma blusa da época vertida ao popular para “caga em pé”, chama a atenção e um chapa da plataforma pergunta de quem é a carga a transportar. Outro arremata: “É do Jesus Cristo em férias”.

Essa é divertida, mas há uma crudelíssima: havia nas imediações da estação um pobre ser que vivia, sem braços e pernas, numa caixa de papelão. Apelido terrível: croquete. O autor deve conviver com Belzebu.

Passarinho, ave e jogador O Coritiba enfrenta o Seleto em Paranaguá. Alcione, lateral esquerdo do time da cidade, durão, não suporta os dribles do ponta direita Passarinho e aplica-lhe uma voadora. O jogador rola no gramado e a torcida, no primeiro momento, aplaude, afinal o drible, em certas circunstâncias, como diria Ortega y Gasset, é uma desonra. Mas de repente, tomada por um sentimento agudíssimo de culpa, daqueles de desafiar Macbeth, a torcida, a mesma que ululava, entra em profundo silêncio, preocupada com a hipótese de uma fratura. E no meio do silêncio sepulcral a vozinha característica do litorâneo com a receita “assopra no cuzinho dele que ele levanta”. Aquele gesto comum dos meninos, dando pelotadas nas aves e quando as derrubavam e pretendiam salvar davam o sopro milagroso, quase um boca-a-boca dos nossos dias contemporâneos.

Como Ben Hur Uma das manias curitibanas é tirar as pessoas da roda para falar em particular ou pior ainda intervir, interrompendo a conversa. Estou na Boca Maldita e dois amigos, tidos na praça como “caras de cavalo” por causa do rosto comprido e alongado, me afastam da turminha, afetivamente, mas com alguma força me tiram da “chacrinha”. Quando vi a situação com aquelas duas criaturas me conduzindo na direção da Praça Osório não perco a deixa e lembro que estou ali como um Ben Hur conduzindo uma biga romana. Na verdade mais sendo conduzido do que conduzindo o reverso do “teaser” da bandeira paulista: “Ducco, non duccor”. Conduzo, não sou conduzido. Infelizmente não cabe para nós paranaenses quase sempre a reboque dos outros.

Aliás sobre símbolos paranaenses há uma piada genial do Joffre Cabral Silva sobre o homem que aparece com uma foice, hoje querem substituí-lo pelo semeador, configurando a agricultura: “Esse é um curitibano com um alfanje na mão pronto para cortar a cabeça do primeiro que tente aparecer”.

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